Marcelo Korn

jan 17 2024

Existe um assunto inadiável que, no entanto, está sendo cronicamente postergado. Faz lembrar tantos temas que são abordados quando é quase tarde demais, como foi o boom do ERP no Brasil. Quantas vezes vimos isso antes – ninguém toca em uma questão exigente para evitar ter que lidar com as demandas que poderá trazer: tomar decisões, mudar processos, transformar culturas internas.

Estou falando de um ponto muito importante que está sendo discutido no mercado apenas da forma mais subliminar, algo que surge em rodas de conversas mas não é encarado como o grande problema que na realidade é. Vamos levantar essa bola que logo será tema principal entre empresas cuja atuação envolve e depende de tecnologia – ou seja, em todas?

Processos contábeis, fiscais, de RH, enfim tudo o que ocorre nas empresas precisa de um sistema integrado de gestão. Lembrando que estamos falando do coração das corporações de todos os escopos e tamanhos na atualidade, seus dados, o norte em um universo a cada dia mais data driven.

A migração do sistema SAP para as versões mais atuais são preocupações quase exclusivas dos consultores e dos próprios clientes que estão se sentindo pressionados. Os grandes players têm tratado o tema S/4HANA como aquele assunto chato que poderá ser resolvido em outro momento mais adequado.

Mas a verdade incômoda é que, a qualquer instante, terá chegado a hora e simplesmente não haverá quem o faça. Curiosamente, as empresas sabem disso, apenas empurram o problema um pouco mais para a frente. Não há como encontrar ou formar, e muito menos reter, talentos qualificados e em quantidade suficiente para atender todas elas.

O Google for Startups aponta ausência de talentos com perfil sênior e prevê déficit de 530 mil profissionais de TI até 2025; a Brasscom calcula que 53 mil profissionais irão se formar entre 2021 e 2025, face a uma demanda por 800 mil novos talentos nesse período; ainda em 2022, a Gartner alertava: mais de 64% dos executivos em TI já identificavam que o processo de transformação digital das empresas esbarrava na falta de mão de obra qualificada. O turnover das empresas de TI no Brasil foi de 51% entre abril de 2022 e maio de 2023 segundo o Caged.

O especialista em SAP possui competência para codificar, mas terá que adquirir expertise em implementar, integrar e configurar plataformas de software essenciais para manter a operação. Formar esses profissionais será um excelente negócio – para os mesmos, quando suas habilidades serão recompensadas à razão de seu peso em ouro. O desafio da retenção de talentos será, então, uma missão impossível.

Uma solução parece ser a diversificação. O chamado Composed  ERP faz o cenário parecer menos pavoroso, mas não muito mais do que isso. Envolvendo a criação de uma rede de aplicativos, dados e provedores de soluções que funcionam perfeitamente juntos para atender a qualquer necessidade empresarial, o Composed não é um novo tipo de ERP, mas uma estratégia que proporciona o poder de modificar seu ERP conforme as necessidades do seu negócio.

A migração parametrizada, com o desenvolvimento de softwares complementares, pode mitigar o risco do apagão por falta de recursos humanos, mas cria um problema conhecido de documentação, algo a ser fortemente evitado.

As empresas maiores estão fazendo a migração através de roadmaps de prazos relativamente alongados, enxergando um prazo final em 2027. O mercado em geral está andando na corda bamba: se um número razoável de empresas decidir fazer a migração em simultâneo, a maior parte delas estará descoberta, simplesmente sem braços para fazer o trabalho indispensável.

Mesmo investindo bons volumes financeiros no corpo técnico, veremos problemas que nascem da própria demanda hipertrofiada: turnover acentuado, profissionais cobrando (e merecendo) valores estratosféricos, fidelidades fluidas nas consultorias. Deixar para agir em um mercado superaquecido quando ele atinge o ponto de ebulição é uma estratégia, para dizer o mínimo, bastante arriscada.

A SAP discute a necessidade de fazer a migração há 5 ou 6 anos, parecendo, na percepção do mercado, estar sendo mais assertiva em não estender o prazo apenas recentemente. Acreditar em mais meia década de respiro é acender uma vela ao invés de trocar a instalação elétrica, sabendo que a reforma é inadiável. Procurar mão de obra técnica especializada quando as luzes estiverem piscando só poderá ter como resultado um apagão.

“É disso que precisamos falar urgentemente, até mesmo porque todos estarão falando disso muito em breve: o apagão de especialistas em fazer e manter a migração.”

Ferramentas de produtividade fazem o papel de exércitos de trabalhadores. Ao invés de grupos de operários assentando tijolo sobre tijolo, utilizar blocos pré-moldados reduz a dependência de conhecimento técnico. O sistema modular permite driblar o blecaute de mão de obra ao mesmo tempo que cria a documentação necessária para trocar o encanamento e ainda manter o edifício em pé.

O equivalente em tecnologia é a adoção de Low Code/No Code e inteligência artificial generativa com aprendizado de máquina, ferramentas que vão acelerar o processo de desenvolvimento e reduzir a dependência específica de conhecimento técnico.

O que pode, hoje, parecer uma pauta inovadora será logo realidade: o fator crítico da migração SAP será a carência de mão de obra. Não foi outro o motivo que fez nascer e crescer a Tachyonix.

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